Treze Tílias, a família Moser e o Cristo Crucificado da Catedral de Maringá

1973

Texto de Marco Antonio Deprá

Treze Tílias

Em 13 de outubro de 1933, 82 famílias de imigrantes do estado do Tirol, na Áustria, chegaram à região oeste de Santa Catarina, onde fundaram a Colônia Dreizehnlinden, na localidade denominada Papuan, no então município de Cruzeiro do Sul, depois denominado Joaçaba. 

O grupo era liderado por Andreas Thaler, então Ministro da Agricultura da Áustria, que também se estabeleceu na colônia. Os imigrantes encontraram um clima temperado, semelhante ao clima europeu, e terras férteis onde se dedicaram à agropecuária.

Dreizehnlinden é um épico do poeta alemão Friedrich Wilhelm Weber que trata da batalha final entre os francos e os saxões na Europa Central, entre o então emergente cristianismo e o paganismo germânico. Como os portadores principais dos ideais da cristandade naquele período da história européia eram os monges cristãos, o poeta inseriu em sua obra um claustro fictício, o qual ele chamou de "Dreizehnlinden", que em português pode ser traduzido como Treze Tílias – a Tília é uma árvore de grande beleza, muito comum na Áustria.

Imagem 1 – Um belo exemplar da árvore Tília (Linde,  em alemão).
Fonte: Wikipédia Alemã

Imagem 2 – Google Earth – Em amarelo o território do município de Treze Tílias (SC), que foi elevado a município em 29/04/1963.

Josef Moser

Em 1935, Josef Moser, então com 25 anos de idade, chegou à Colônia Dreizehnlinden. Nascido em 15 de fevereiro de 1910 em Wildschönau, no Tirol Austríaco, era filho de Peter e Teresia Moser. Aos 17 anos ingressou na Academia de Belas Artes em Viena, capital da Áustria. Cinco anos depois, foi transferido para a Academia de Belas Artes de Munique, na Alemanha, onde concluiu seus estudos. Lá se casou com Maria Schifler. 

Imagem 3 – Josef Moser e sua esposa Maria Schifler.
Fonte: Facebook – Academia Mourãoense de Letras

De acordo com sua ficha de imigração, Josef Moser chegou ao Porto de Rio Grande (RS) em 12 de abril de 1935. Quatro dias depois, chegou à Colônia Treze Tílias, onde construiu uma casa e nasceu sua única filha, Hildegard. Nessa época, já conseguia bons recursos com a venda de suas esculturas para diversas regiões do país.

Em outubro de 1950 mudou-se para Peabiru (PR), depois de aceitar ser sócio de uma serraria naquela cidade. Em 1953, em tempos de geada e crise financeira, esculpiu um grande Cristo Crucificado, considerada uma de suas mais perfeitas obras.

Em 1955, Josef e seu irmão Michael, em companhia dos amigos Andrä Thaler e Ludwig Brugger, representando a Áustria, participaram do Congresso Eucarístico realizado no Rio de Janeiro (RJ).

Imagem 4 – Participantes do Congresso Eucarístico do Rio de Janeiro, ano de 1955. Da esquerda para a direita: Ludwig Brugger, Michael Moser, Josef Moser e Andrä Thaler. Sentado, Padre Johann Reitmeier.
Fonte: https://www.trezetilias.com.br/escultura

Voltando para Peabiru, Josef Moser resolveu dedicar-se exclusivamente à arte. Esculpiu uma sereia numa coluna da varanda de sua casa e nas balaustradas 13 peixes exatamente iguais.

Imagem 5 – Os amigos Wilson Carvalho, Osvaldo Frare, João Carlos, Neurides Brero e Oscar na varanda da casa de Josef Moser, em Peabiru (PR). 
Fonte: Facebook - Núcleo de Estudos Caminhos de Peabiru - NEP 

Imagem 6 – Sereia esculpida por Josef Moser na coluna da varanda de sua casa em Peabiru (PR).
Fonte: Facebook - Núcleo de Estudos Caminhos de Peabiru - NEP 

Imagem 7 – Josef Moser em sua casa em Peabiru (PR).
Fonte: Facebook – Academia Mourãoense de Letras

A casa de Josef Moser situava-se na rua Ibituva, que depois passou a ser denominada avenida Peabiru e, em 1970, foi alterada novamente para avenida José Moser, por onde também passava a rodovia PR-317 e BR-158, ligando Maringá a Campo Mourão. Atualmente, no terreno da antiga casa funciona o Posto Diamante.

Imagem 8 – Google Earth – Em amarelo a localização do terreno onde Josef Moser construiu sua casa em Peabiru, à beira da estrada Maringá – Campo Mourão. A Igreja São João Batista e a Igreja Evangélica Luterana abrigam obras do escultor.

A partir de 1965, Josef Moser recebeu em sua casa o sobrinho Conrado Moser, filho de seu irmão Michael Moser, para ensinar-lhe o ofício de escultor.

Josef Moser faleceu em 23 de setembro de 1968 em virtude de um acidente doméstico. Estava com 58 anos de idade. Foi sepultado no Cemitério Municipal de Peabiru.

Suas obras “Cristo Morto” e “Cristo Crucificado”, ambas esculpidas em madeira, foram encomendadas pelo padre alemão Aloísio Jacob para a parede do altar da igreja São João Batista de Peabiru. Outra obra sua, o “Rosto de Cristo”, encontra-se no púlpito da Igreja Evangélica Luterana Trindade de Peabiru.

Com seu falecimento, o atelier passou a ser administrado pelo sobrinho e aprendiz Conrado Moser.

Conrado Moser 

Conrado Moser nasceu em Treze Tílias (SC) em 27 de outubro de 1944, filho de Michael Moser e Maria Thaler, tendo como irmãos André, Raimundo, Bernardo, Hilda, Cecília e Rudolfo.

Em 1957, com apenas 13 anos de idade, começou a aprender a fazer esculturas em Treze Tílias. 

Como mostrou ter talento, o tio Josef Moser o convidou para trabalhar em seu atelier em 1965, quando então se transferiu para Peabiru, no Paraná.

Em 1968, após a morte de Josef Moser, Conrado continuou em Peabiru administrando o atelier do tio. Ao todo, permaneceu em Peabiru por sete anos, até 1973, quando se mudou para Maringá (PR). O convite para vir para a Cidade-Canção foi feito pela Universidade Estadual de Maringá, que pediu que Conrado ministrasse um curso sobre esculturas.

Em Maringá, Conrado relacionava-se com conterrâneos catarinenses do Vale do Rio do Peixe, como o odontólogo Arno Vier, nascido em Luzerna (SC), cidade próxima a Treze Tílias.

Entre 1973 e 1974, Conrado Moser esculpiu o Cristo Crucificado que foi instalado na Catedral de Maringá.

Ainda em 1974, viajou para a Alemanha, onde participou de curso de aperfeiçoamento em Oberammergau e trabalhou como escultor em uma empresa especializada no ramo. Neste período, conheceu Katharina Holzer, nascida em Stuhlfelden, Salzburg, na Áustria, com quem se casou em Maringá (PR) em 1976.

Retornando a Maringá, Conrado Moser dedicou-se exclusivamente ao ofício de escultor. Seu atelier ficava na avenida Colombo, nº 6128, bem em frente à Igreja Santa Maria Goretti. 

Imagem 9 – Google Earth – Em amarelo o terreno onde estava instalado o atelier do escultor Conrado Moser, em Maringá (PR).

Imagem 10 – Obra exposta no atelier da avenida Colombo, que à época tinha outra numeração (nº 3956). 
Fonte: Acervo da Família Moserfonte: Acervo da Fam%C3%ADlia Moser

Imagem 11 – Fachada no atelier de Conrado Moser em Maringá nos anos 1970.
Fonte: Acervo da Família Moser

Imagem 12 – Katharina, esposa de Conrado Moser, em frente ao atelier da avenida Colombo, em Maringá. O artista também esculpia portas. 
Fonte: Acervo da Família Moser

Conrado Moser esculpiu diversas obras em Maringá, que atualmente estão em residências particulares e igrejas de diversas regiões do país.

Também colaborou na formação do grupo folclórico alemão do Clube Cultural e Esportivo Teuto-Brasileiro de Maringá, visto que, desde 1958, já participava ativamente de grupo folclórico em Treze Tílias, que em 1959 havia se apresentado no Teatro Guaíra, em Curitiba (PR).

Foi Conrado Mommensohn, sócio proprietário da empresa Comercial Catarinense, quem pediu a colaboração de Conrado Moser para formar o Grupo Folclórico do Teuto-Brasileiro. 

Para compor a banda de música do grupo folclórico, Conrado Moser indicou os seguintes músicos:

  • Nilo Caetano Breda, acordeonista catarinense nascido na localidade de Bom Sucesso, no município de Iomerê e à época proprietário da empresa Carrocerias Breda em Maringá; 
  • Arnildo Angeli, clarinetista catarinense de Piratuba, genro de Conrado Mommensohn; 
  • Emílio Edmundo Eidam, bandolinista paranaense nascido na Colônia Bom Jardim, atualmente denominada Bom Jardim do Sul, distrito de Ivaí (PR), que era proprietário da empresa Elite Magazine, em Maringá;

    Com a formação da banda, tiveram início os ensaios do grupo folclórico, que se apresentou pela primeira vez em 10 de maio de 1977.

    Cláudia, filha primogênita de Katharina e Conrado, nasceu no dia 02 de julho de 1981, em Maringá. Atualmente, tem graduação universitária em Psicologia e Hotelaria e Turismo. 

    Ainda em julho de 1981, Conrado e sua família transferiram residência para Curitiba (PR), onde viveriam por dez anos. Neste período, Conrado Moser fez esculturas para diversas igrejas, como o Cristo Ressuscitado da Igreja Santa Rita de Cássia, na Vila Hauer, em Curitiba. 

    Na capital paranaense nasceram os outros filhos do casal, todos registrados em Treze Tílias (SC):  Conrado Michael, nascido em 31 de julho de 1982; Silvia, nascida em 03 de janeiro de 1984; e Karin, nascida em 27 de novembro de 1987.

    Imagem 13 – O escultor Conrado Moser e sua esposa Katharina ladeando um Cristo em madeira. A fotografia foi produzida por Luiz Cesar Hladu no começo da década de 1980 para o jornal "O Estado do Paraná", e pertence ao acervo pessoal de Barbara Lia.  Fonte: https://www.tumblr.com/peabirupedia-blog

    Conrado Moser decidiu investir na construção de um hotel em Treze Tílias, cujas obras tiveram início em 1989. A escolha por este tipo de negócio deveu-se ao fato de sua esposa Katharina ter trabalhado em hotéis na Áustria desde os 16 anos de idade.

    Treze Tílias – O retorno

    Em 1990, Conrado Moser e sua família transferiram residência para Treze Tílias, então uma pequena cidade que já era considerada a Capital Catarinense da Escultura em Madeira e voltada para o turismo, onde certamente seus conhecimentos seriam muito úteis.

    Em 1993, Conrado e sua família inauguraram o “Hotel 13 Linden” (Hotel 13 Tílias, em português) que, com o tempo, foi sendo ampliado e recebendo melhorias. No interior do estabelecimento encontram-se diversos trabalhos da Família Moser, proprietária do hotel. São obras sacras de Conrado Moser, que possui seu atelier em um prédio anexo ao hotel, e também as obras do filho Conrado Michael que seguiu os passos do pai na escultura.

    Katharina Moser, trabalha com Kerbschnitzerei, ornamentos geométricos, trabalhados numa técnica única popular, muito antiga, geralmente praticada nos Alpes europeus. É voltada para a decoração de tetos, pilares, janelas, baús, portas e quadros.

    Cláudia, a filha primogênita, participa da administração do Hotel.

    O segundo filho, Conrado Michael, aprendeu a esculpir com o pai e, depois, cursou a escola de escultura em Oberammergau, na Alemanha, entre os anos 2001 e 2004.  Recebeu do Governo da Baviera uma homenagem como aluno destaque, ficando em segundo lugar em um torneio internacional de escultura em gelo. Já fez escultura em madeira de 19 metros.

    Silvia Moser, terceira filha, graduou-se em Hotelaria e Turismo. Depois, tornou-se religiosa, adotando o nome de Rosa da Cruz. Atualmente, é a Madre Superiora da Congregação Religiosa das Irmãs Servas Adoradoras da Misericórdia, com sede em Içara (SC). Em Maringá, a congregação mantém a Casa São Juan Diego, sediada no Núcleo Social Papa João XXIII, entidade que mantém 75 casas onde habitam famílias carentes com filhos pequenos.

    Karin, a filha caçula, é chefe de cozinha e nutricionista, graduada em Curitiba.

    Imagem 14 – Katharina e Conrado Moser, vestidos com traje típico do Tirol Austríaco.
    Fonte: Acervo da Família Moser

    Imagem 15 – Da esquerda para a direita: Cláudia Moser Arns, seu esposo Felipe Arns e sua irmã Karin Moser Chara. 
    Fonte: Facebook - Karin Moser Chara


    Imagem 16 – Conrado Michael Moser

    Imagem 17 – Silvia Moser – Irmã Rosa da Cruz

    Conrado Moser calcula ter esculpido 3 mil peças até os dias atuais, todas assinadas com a marca “C. Moser”.

    Além de escultor e empresário, Conrado Moser é músico especialista em Alphorn (Trompa Alpina), instrumento de sopro geralmente feito de madeira no formato de um tubo longo e cônico, que é dobrado na extremidade como um chifre de vaca e se funde em um sino. 


    Imagem 18 – Família de Conrado e Katharina no Hotel 13 Linden em Treze Tílias (SC). À esquerda, Conrado e seu Alphorn.  
    Fonte: Acervo da Família Moser

    O monumento em homenagem ao imigrante austríaco que está localizado em frente ao prédio da Prefeitura Municipal de Treze Tílias, na praça Ministro Andréas Thaler, representa uma família de imigrantes, em que se vê o pai, a mãe e dois filhos pequenos, sendo um deles ainda de colo. Também um machado, ferramenta de trabalho que representa o esforço para retirar do local sua fonte de sustento.  A obra foi esculpida por Conrado Moser e seu irmão Rudi (Rudolfo) Moser, em comemoração aos 55 anos da imigração austríaca, completados  em 1988. 

    O Cristo Crucificado da Catedral de Maringá

    A escultura do Cristo Crucificado instalada no lado esquerdo do altar da Catedral de Maringá foi realizada por Conrado Moser entre os anos 1973 e 1974, há 50 anos. Tanto o Cristo quanto a Cruz foram esculpidos em troncos de Cedro adquiridos em Peabiru e doados pelo empresário Carlos Rodolpho Philipp.

    O artista fez a escultura em um galpão da serraria C. R. Philipp e Cia Ltda.,situada na rua Mitsuzo Taguchi, onde atualmente existem o Residencial Sandra Regina (nº 184) e o Residencial Peruíbe (nº 248).

    Conrado demorou alguns meses para concluir a obra, que foi exposta ao público em uma mostra do artista no saguão interno do Edifício Centro Comercial de Maringá, bem em frente à praça Raposo Tavares. 

    Imagem 19 – Google Earth – Em amarelo a localização da antiga serraria C. R. Philipp e Cia Ltda., onde foi feita a escultura do Cristo Crucificado da Catedral. Em verde, o Quarto Batalhão da Polícia Militar do Paraná e em azul o Terminal Rodoviário Vereador Jamil Josepetti.

    O primeiro Bispo de Maringá, Dom Jaime Luiz Coelho, foi visitar a mostra, encantou-se pela obra e decidiu adquiri-la. O pagamento foi feito ao escultor pelo próprio Bispo.  No livro “Nas alturas – a história da Paróquia Catedral de Maringá”, de autoria do escritor Rogério Recco, consta que a obra foi presenteada à igreja por Ruy D` Andrea Henriques, filho do pioneiro e empresário Vanor Henriques.

    De acordo com o depoimento do artista, o Cristo mede 3,50 metros e a Cruz, 7 metros. A obra, depois de pronta, recebeu apenas uma camada de cera de abelha, para proteção.

    Um caminhão guincho da Companhia Paranaense de Energia – Copel foi utilizado para erguer a escultura e fixá-la na parede dos fundos do altar da Catedral.

    Imagem 20 – Funcionários da Copel trabalharam por três dias para transportar e fixar a obra na Catedral, cujo trabalho foi concluído em 23/05/1974. Nos dias seguintes, mais de 3.000 pessoas foram ver a obra.

    O interessante é que, nesta mesma época, entre os dias 19 e 21 de abril de 1974, outro artista também expôs no Edifício Centro Comercial uma escultura do Cristo Crucificado. O jovem artista era Dirceu Rosa, que atualmente reside em Cascavel (PR) e  se inspirou no trabalho de Conrado Moser para começar a esculpir em madeira, após ver uma de suas exposições na praça em frente à Catedral de Maringá.

    Imagem 21 – Altar da Catedral Basílica Menor Nossa Senhora da Glória, em Maringá. A obra imponente do artista Conrado Moser foi instalada no lado esquerdo do altar.
    Fonte: Acervo de Marco Antonio Deprá

    Imagem 22 – Cristo Crucificado, obra de Conrado Moser
    Acervo: Marco Antonio Deprá

    Fontes:
    Depoimento de Conrado e Katharina Moser / Depoimento de Pedro Martins Philipp / Acervo da Folha do Norte do Paraná / Hemeroteca da Biblioteca Nacional / Site: http://www.teutobrasileiro.com.br/folclore.html / Site: https://www.adoradorasdamisericordia.com.br / Livro: Nas alturas – a história da Paróquia Catedral de Maringá, de Rogério Recco.



    Inscreva-se

    * respeitamos nossos inscritos, não enviamos spam.

    Inscreva-se

    * respeitamos nossos inscritos, não enviamos spam.

    Cookies: nós captamos dados por meio de formulários para melhorar a sua experiência no site. Ao continuar navegando, você concorda com a nossa Política de Privacidade.